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Eu, o medo, a bicicleta e a cidade

Ontem enquanto fazia pela última vez meu trajeto de casa para a Universidade, pensei no quanto eu tinha evoluído no sentido de pegar a bicicleta e ir o de eu queria.

A verdade é que, como uma boa garota nascida e crescida em cidad pequena, eu sempre tive muito medo das grandes cidades. Esse medo foi afrontado quando fui morar em Belo Horizonte. Eu tinha horror só de pensar naqueles ônibus lotados, mas estreei na capital em 2015 precisando pegar o MOVE da Pampulha para a area hospitalar sempre em horários de pico (eu precisava trabalhar/estudar na UFMG campus saúde e não tinha carro). Esse trajeto me tomava no mínimo 2 horas por dia.

A história com a bicicleta começou um pouco mais tarde, quando eu já estava mais a vontade com a cidade, mas ainda com medo. Meu namorado da época (hoje meu marido) foi quem me encorajou. Ele, especialista e ativista em mobilidade urbana, me acompanhou quando peguei a primeira bike Itaú e adivinhem o que senti? MEDO. MUITO MEDO! Após essa primeira experiência, eu tinha certeza de que não andaria de bicicleta para me deslocar nunca mais. No entanto, eu acabava alugando uma bicicleta de vez em quando, sempre acompanhada porque isso me fazia sentir menos insegura.


Em 2018, comecei a sofrer de ansiedade. Aquilo me atordoava muito porque não sabia o que eram aqueles sintomas (taquicardia, dores de cabeça, má qualidade do sono etc), muito menos como tratá-los. Quando descobri que era ansiedade, comecei a estudar muito sobre o assunto e tive a oportunidade de conhecer profissionais que me ajudaram a reencontrar meu equilíbrio. Me lembro que em uma das minhas sessões de acupuntura eu falei sobre coisas que eu gostava de fazer e também sobre o porque de eu não fazê-las, chegando a citar o medo que eu tinha da cidade.

Isso representou um desbloqueio para mim porque eu não tinha noção do quanto eu deixava de fazer coisas que eu gostava por medo. Sendo que nada tinha me acontecido para que eu me travasse daquela forma.


Nessa época então eu conheci um grupo de mulheres que saem para pedalar a noite em Belo Horizonte. Elas vão juntas e se tornam visíveis no trânsito por serem muitas. Eu tive então algumas ocasiões de me juntar a elas (Bike das Manas) e experimentei de uma liberdade que para mim era inédita. Eu me sentia segura por estar com essas mulheres fortes, ativistas, feministas, esportivas e muito animadas pra subir as ladeiras da cidade (que não são poucas).


Eu me sentia feliz por estar na cidade a noite, eu sempre gostei de andar na cidade a noite mas não o fazia por causa do medo.

Hoje eu vejo o quanto essas memórias vão ficando marcadas em nós. Memórias de como superar o que nos incomoda, nos amedronta e sobretudo, mata algumas partes importantes de nós. Naquele momento a ansiedade representava uma parte da minha essência que estava sendo apagada.


Hoje eu vejo porquê em novembro do ano passado, justamente pegando o metrô em um dia frio para ir à universidade, eu decidi que eu compraria uma bicicleta dobrável para não mais me deslocar com o transporte público. Ali estava eu, cansada e estressada por causa do coronavirus, vendo uma senhora brigar com uma mãe que colocou uma criança do lado dela (pegar transporte é um grande estresse quando todo mundo tem medo de um vírus que pode estar em qualquer lugar). Pensei no frio que estava por vir nos meses seguintes (dezembro, janeiro e fevereiro são os piores meses), mas pude resgatar dentro de mim a memória de que o frio talvez fosse apenas o obstáculo a ser superado.

Finalmente descobri que a bicicleta não necessariamente nos faz sentir mais frio, já que a atividade física esquenta e nos deixa animados. Nada mal para o inverno! O problema mesmo é a chuva (aqui chove muito durante o inverno), mas uma bicicleta dobrável me permitiria pegar metrô ou ônibus caso chovesse e eu não quisesse chegar molhada. Bom, comecei meu texto dizendo que ontem eu fui para a universidade pela última vez de bicicleta. Esse é o motivo da minha pequena alegria de hoje: ter conseguido fazer uma boa parte da minha formação indo de bicicleta. Quando penso na menina mulher que encarou seus medos chegando em Belo Horizonte em 2015, imagino que ela estaria orgulhosa de me ver hoje. No fundo, acho que é isso que a gente ganha quando encaramos o que nos amedronta.

E você, já pensou no que te amedronta hoje?





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